Profissão de fé do século XX
No ponto de evolução a que o pensamento humano chegou; considerando, do alto dos sistemas filosóficos e religiosos, o problema formidável do ser, do universo e do destino, em que termos poderiam resumir-se as noções adquiridas, numa palavra, qual poderia ser o Credo filosófico do século XX?
Já tentei resumir no livro Depois da Morte, à guisa de conclusão, os princípios essenciais do Espiritismo moderno. Se dermos a esse trabalho nova forma, adotando por base, como o fez Descartes, a própria noção do ser pensante, mas desenvolvendo-a e ampliando-a, poderemos dizer:
1 – O primeiro princípio do conhecimento é a idéia do Ser (inteligência e vida). A idéia do ser impõe-se: Eu sou! Essa afirmação é indiscutível. Não podemos duvidar de nós mesmos. Mas essa idéia, por si só, não é suficiente; deve completar-se com a idéia de ação e vida progressiva: Eu sou e quero ser, cada vez mais e melhor!
O Ser, em seu “eu” consciente – a alma –, é a única unidade viva, a única mônada indivisível e indestrutível, de substância simples, que debalde se procura na matéria, porque só existe em nós mesmos. A alma permanece invariável em sua unidade através dos milhares e milhares de formas, dos milhares de corpos de carne que constrói e anima para as necessidades de sua evolução eterna; é sempre diferente pelas qualidades adquiridas e pelos progressos realizados, cada vez mais consciente e livre na espiral infinita de suas existências planetárias e celestes.
2 – Entretanto, a alma só em metade pertence a si mesma. Pela outra metade ao universo, ao todo de que faz parte. Por isso só pode chegar ao inteiro conhecimento de si mesma pelo estudo do universo.
A aquisição desse duplo conhecimento é a própria razão e o objeto de sua vida, de todas as suas vidas, pois a morte é simplesmente a renovação das forças vitais necessárias para mais uma nova fase.
3 – O estudo do universo demonstra, logo à primeira vista, que uma ação superior, inteligente, soberana, governa o mundo.
O caráter essencial dessa ação, pelo próprio fato de sua perpetuidade, é a duração. Pela necessidade de ser absoluta, essa duração não poderia comportar limites: daí a eternidade.
4 – A Eternidade, viva e agente, implica o ser eterno e infinito: Deus, causa primária, princípio gerador, origem de todos os seres. Dizemos eterno e infinito, porque o ilimitado na duração implica matematicamente o ilimitado na extensão.
5 – A ação infinita está ligada às necessidades da duração. Ora, onde há ligação, relação, há lei.
A lei do universo é a conservação, é a ordem e a harmonia. Da ordem deriva o bem; da harmonia deriva a beleza.
O fim mais elevado do universo é a beleza sob todos os seus aspectos: material, intelectual, moral. A justiça e o amor são seus meios. A beleza, em sua essência, é, pois, inseparável do bem e ambas, por sua estreita união, constituem a verdade absoluta, a inteligência suprema, a perfeição!
6 – O objetivo da alma, em sua evolução, é atingir e realizar em si e em volta de si, através dos tempos e das estações ascendentes do universo, pelo desabrochar das potências que possui em gérmen, essa noção eterna do belo e do bem, que exprime a idéia de Deus, a própria idéia de perfeição.
7 – Da lei da ascensão, bem entendida, deriva a explicação de todos os problemas do ser: a evolução da alma, que recebe, primeiramente, pela transmissão atávica, todas as suas qualidades ancestrais, depois as desenvolve por sua ação própria, para lhes acrescentar novas qualidades; a liberdade relativa do ser relativo no Ser absoluto; a formação lenta da consciência humana através dos séculos e seus desenvolvimentos sucessivos nos infinitos do porvir; a unidade de essência e a solidariedade eterna das almas, em marcha para a conquista dos altos cimos.
– FIM –